Joinville, 18 de julho de 2014 - PUBLICAÇÕES ONLINE
A existência de usucapião a favor do comprador do imóvel pode
fundamentar a anulação de negócio jurídico de compra e venda por erro
essencial. O entendimento é da Quarta Turma do Superior Tribunal de
Justiça ao rejeitar recurso interposto contra decisão do Tribunal de
Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS), que entendeu que a usucapião,
apesar de ainda não reconhecida em sentença, poderia anular o negócio
por erro essencial do contratante.
O erro essencial é aquele sem o qual o contratante não concluiria o
negócio. No caso analisado pelo STJ, o comprador alegou que foi
pressionado pela imobiliária a adquirir um imóvel em cuja posse já
estava havia 16 anos, e que chegou a pagar 216 parcelas do contrato.
Tanto o juízo singular quanto o tribunal local entenderam que o
comprador foi induzido a adquirir um bem que já lhe pertencia pelo
decurso de prazo. O TJRS ainda reconheceu o direito à devolução das
parcelas.
O vendedor alegou em recurso ao STJ que as partes pactuaram
livremente as condições do contrato e que não teria havido coação, pois o
objetivo era apenas regularizar a situação do invasor do imóvel. As
instâncias ordinárias entenderam que o comprador era pessoa simples, que
não tinha conhecimento de seu direito à declaração de domínio pela
prescrição aquisitiva.
Homem mediano
O Código Civil de 1916 considerava anulável o ato jurídico por vício
resultante de erro, dolo, coação, simulação ou fraude. Quanto ao erro,
estabeleceu serem anuláveis os atos jurídicos quando as declarações de
vontade resultassem de erro substancial. Segundo o relator do caso,
ministro Luis Felipe Salomão, o Código de 2002 manteve a regra de que o
erro ou a ignorância é causa de anulação dos negócios jurídicos.
A jurisprudência do STJ é no sentido de que o erro que motiva a
anulação de negócio jurídico, além de essencial, deve ser perdoável em
razão do desconhecimento natural das particularidades do negócio
jurídico pelo homem mediano. Para ser desculpável, o erro deve ser de
tal monta que qualquer pessoa de inteligência mediana o cometeria.
No caso julgado, o relator considerou que não parece crível que uma
pessoa faria negócio para adquirir uma propriedade que já é do seu
domínio. “Parece ter havido também um induzimento malicioso com o
propósito de obter uma declaração de vontade que não seria emitida se o
declarante não tivesse sido ludibriado”, afirmou o ministro.
Dolo
Para Salomão, é razoável que o comprador – auxiliar de serviços
gerais, com baixo nível de instrução e sem familiaridade com assuntos
jurídicos – “não soubesse que o exercício de sua posse no imóvel por um
longo lapso temporal seria hábil a lhe conferir a propriedade do bem”.
O dolo que motiva a anulação do negócio jurídico é tanto o comissivo
quanto o omissivo, disse Salomão, ao mencionar que o Código Civil de
1916, em seu artigo 94, já estabelecia que “nos atos bilaterais o
silêncio intencional de uma das partes a respeito de fato ou qualidade
que a outra parte haja ignorado constitui omissão dolosa”.
O relator observou ainda que, “preenchidos os requisitos da
usucapião, há, de forma automática, o direito à transferência do
domínio, não sendo a sentença requisito formal à aquisição da
propriedade”. Ele explicou que, decorrido o prazo previsto em lei, o
possuidor passa a deter o domínio sobre o imóvel, e que a sentença no
processo de usucapião é meramente declaratória, servindo como título
para ser levado ao registro de imóveis.
Esta notícia se refere ao processo: REsp 1163118
FONTE: STJ
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